quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Cálice




Escrita em 1973, a música cálice de Chico Buarque e Milton Nascimento, ecoou como um grito, mesmo que abafado pelas forças dominadoras da época. Para vocês terem uma ideia, só em 1978 a música foi permitida nas terras verde e amarelo, tão foi o impacto da letra, na época da ditadura militar. Foi um grito de alguém que precisava ficar calado, mas que não queria. O grito de alguém que não se conformava com a forma que a vida ia sendo tratada e levada, alguém que simplesmente não aceitou, alguém que buscou transformação e por aí vai.
Engraçado, o quão essa letra ainda continua tão atual. O quão se pode aplicar ela na realidade não só do Brasil como nação, mas da triste e indigna realidade do evangelho deturpado e violentado por homens sem escrúpulos, desse corrompido e já não mesmo tão dito mundo gospel.
Não sei o quanto e não consigo quantificar como isso tem me ferido.
E parece que toda vez que tento não me conformar com essa realidade, preciso cada vez mais me calar, porque ninguém, são poucos, os que tem se importado com esses absurdos que estão sendo feitos, propagados e vividos.
Muitos estão sendo guiados por guias cegos e suas porcas gordas e cheias de sangue inocente. Um dia o escritor do livro de Hebreus disse que a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais penetrante que faca de dois gumes, mas a faca já não mais corta, ela foi usada para a justificativa das aberrações que fazem diariamente em nome do deus- um deus de cada coração egoísta. São muitos os machucados por essa faca, porém, o sangue da faca é ignorado, é trocado o cabo antes de madeira, por um cabo de ouro reluzente. 
Mesmo calado o peito resta a cuca? Será? Ou será que estamos sendo motivados a aceitar, a viver uma ditadura mascarada como liberdade? Uma ditadura que nos fala o que escutar, o que vestir, que cria segregação (roupas evangélicas, site evangélico, lanchonete evangélica, filme evangélico e por aí vai), que nos afasta do mundo, quando na verdade é no mundo que devemos estar, estando e trazendo vida para a realidade já morta e sem esperança, dizendo pro cara que quer morrer do próprio veneno, que quer perder a cabeça, que o caminho e o caminhar não são esses!
Mas não, temos aceito o cálice . Bebido e nos embriagados com o vinho tinto amargo da hipocrisia, estamos na festa, esquecendo que o verdadeiro cálice precede sofrimento e termina, sempre, em Cruz.
Tenho sido puxada para beber o cálice, ele até tem um gosto bom, é confortável bebê-lo e permanecer a mesma. Só que a dor de cabeça desse porre está me trazendo aquele sentimento que alguma coisa tá errada. Permanecer a mesma não faz parte do TRANSFORMAR, do processo que se resume em carregar uma cruz diária.
Eu renuncio esse cálice, e no fundo do meu coração inconformado, um dos meus sonhos é ver outros inconformados, cansados, talvez, mas dispostos para a mudança da mente que o evangelho puro e verdadeiro causa. Só depois que não se aceita uma realidade suja, é que se levanta para querer mudar.  


E quando chegou àquele lugar, disse-lhes: Orai, para que não entreis em tentação. E apartou-se deles cerca de um tiro de pedra; e, pondo-se de joelhos, orava, dizendo: Pai, se queres, passa de mim este cálice; todavia não se faça a minha vontade, mas a tua. Lucas 22:40-42 

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